sexta-feira, novembro 12, 2010

Quatro Olhos - parte I


Felicidade é ter espelhos tortos, muito tortos, que te mostram convenientemente distorcido em diversas facetas bem reais em todo o seu surrealismo. Surrealismo era existir. Surrealismo era a própria felicidade vermelha em espelhos tortos.

E assim ele era uma pessoa feliz! Com poucos e despretensiosos sonhos. E talvez por isso fosse feliz. Ou talvez por isso não parecesse feliz. Ou talvez fosse a coluna torta e o gosto pelo tempo que o faziam assim: feliz e infeliz em espelhos desiguais nos quais se via uma coluna ereta e um tempo refratado em logos anos claros.

Mas o surrealismo prestava-se ao expressionismo em sua retina. A felicidade vermelha dos dias claros era verde-amarelo-azulada na íris dos seus olhos.

Sim, tinha olhos patriotas. Mas sua pátria era o quintal daquela casa, onde o amarelo, o verde e o azul se misturavam à paisagem bucólica e tridimensional que seus olhos viam debaixo da grande árvore quase morta do extremo leste da propriedade.

Fisicamente, quase morta a infância daquele menino... Mas seus olhos não tinham idade, eram olhos sem tempo.

E eles, os olhos, carregados por seu dono, rotineiramente pedalavam nas estreitíssimas estradas de terra com estacas em preto-e-branco. As brancas do lado esquerdo eram a ida, quando os olhos voltavam-se para o céu e os ouvidos ouviam qualquer música que falasse de calma. Enquanto as estacas pretas eram a volta e os pés eram só velocidade; os olhos quase se fechavam para que os braços sentissem o banho de vento costumeiro.

Mas aquele dia pedia mais vento, mais céu, mais tempo. E a vida pedia mais vida. Pedalou-se então por estradas distantes onde só existia céu e mais nada.

E bem no meio das nuvens eis que a corrente sai das engrenagens que movimentavam as rodas da bicicleta: uma quase queda.

A bicicleta era do avô e estava velha. Mas era verde e quase cantava relembrando os tempos em que era nova e pedalava com o verdadeiro dono. E ele, o neto e atual passageiro, não se importava que fosse velha, nem se importaria se fosse incolor. Na verdade tinha afeição a coisas de outras épocas, que lhe lembravam os desejos que nunca tivera com lembranças do que nunca acontecera – E o que lhes conto é quase uma verdade, e não o contaria se assim não fosse.

Ele que por enquanto não tem nome estava em uma estrada de céu com uma casa sem telhado ao longe, uns coqueiros muito longe, e a casa de uma velha conhecida em alguma nuvem que não se podia ver. Não diria se não fosse: ele sentiu alguma coisa quando pensou na possibilidade de ao consertar a bicicleta pedalar ate a casa da moça e trocar algumas frases.

Sujou as mãos com a graxa da corrente, que não tinha culpa de ter saído de seu lugar, estava cansada de rodar pelo tempo nas ladeiras daquele azul.

Não tinha relógio, mas se tivesse diria que passaram algumas horas, ou talvez por não ter relógio eram horas no plural.

A cidade de onde vinha era muito mais longe do que o lugar de onde partira com a bicicleta verde. E a cidade não o ensinara como consertar bicicletas emborcadas no sem-nome daquele espaço.

Mas ele conseguiu. E pedalou pela casa sem teto, pelos coqueiros sem dono da curva e seguiu. Fazia muito sol. Devia passar das onze. Perdia muita água por entre os poros, mas ganhava fôlego que quase pode ser chamado de liberdade-do-que-fiz-escondido(Aquele lugar era um tanto esquisito, e ninguém o deixaria ter vindo se pedisse).

E com o pudor escondido, chegou na nuvem onde ela morava, perguntou aos vizinhos qual a casa.
Era amarela e tinha portões enferrujados, no quintal uma plantação de mandioca, e na cadeira de balanço uma velha de lenço na cabeça.

Entrou na casa por insistência da mulher. Ela tinha mãos muito boas e negras e olhos muito atentos e enrugados que ao perceberem as mãos sujas de graxa do menino, trouxeram logo um sabonete e uma toalha muito grande. A bacia de alumínio com a água do poço pediam desculpas: os canos não conduziam água para o céu fazia alguns dias de modo que as torneiras estavam de férias como o rapaz.

Então ele agradeceu e aceitou também um copo de qualquer coisa líquida. Quando perguntou por quem procurava, a velhinha que depois ficou sabendo ser a avó legítima da menina, disse que ela tinha ido para a terra onde emana leite e mel, que não ficava muito longe dali.

Ele então agradeceu mais uma vez, e a velha lhe sorriu um sorriso muito singelo cheio de dentes brancos, mas sobretudo, cheio de sinceridade - que para ele tinha vários nomes; naquela hora, porém decidiu chamar de humildade, mas no álbum de fotografias mentais preferiu chamar apenas de sorriso.

Com a bicicleta mais uma vez a pedalar, rumou-se para a terra das promessas, que era mais desenvolvida que ali e tinha a promessa da mágica internet: Não se sabia para que servia mas sabia que era preciso.
Ele desceu as ladeiras do céu – essa terra era muito mais embaixo. Desceu mais um pouco, cruzou uma rodovia cheia de rodas e de cargas e chegou.

Mas não tinha moça, não tinha nada. Era meio dia e meio dia não tinha nada, nem meio nada que é pouco tudo.

E então pedalou com o estômago de volta para os quintais de onde partira inicialmente. Não seria hoje que veria a menina-sol cheia de sardas, de cabelos loiros cheios de dúvidas, de palavras doces cheias do que sempre procurou: paciência. Não seria hoje que veria a dona Simplicidade.

quinta-feira, outubro 21, 2010

DAS DESCULPAS - Amplifique o meu sussurro


Com o lápis roubado de alguém e o pensamento roubado de outros tempos (passado e futuro numa mesma gaveta), eu escrevo. Reporto-me aos tempos que, cansado de ser eu mesmo, desprendi-me procurando o horizonte de outros eus.
Era uma questão de amor: queria amar o entendimento, entender todos (pensantes ou coisas) porque todos eram o que eu era. E eu era a fumaça, a distância, o acostamento, o símbolo do infinito, o número i.
E nessa questão de amar o desprendimento sobraram só as palavras que eram infinitos de sentido muito similar que pulavam de minha mente quando vibravam as cordas vocais, sem pudor nem restrições que é coisa de um ser só quando sabe que é só. Sol só. Só mar.
E de mares e de sois rugia o que chamam desejo. E também só desejava andar com as pernas ou com as rodas de bicicleta. Queria o vento, queria o sol que nasce, queria água potável que era o próton de tudo, queria a fuga do que não se sabe ao certo: talvez rotina ou limite.
E a rotina e o limite poderiam casar-se enquanto substantivos e exercer diversas trocas de posições como fazem alguns casais modernos que ora são adjetivo ora são substantivo que são. Segunda: rotina-limite. Terça: limite-rotina. Quarta: rotina-limite-rotina -----------------------------------------------------------------
Até que chegou o dia da rota-limite, que se tornou rota-limitada, mesmo sentindo a falta do “in” que carregava do meio da segunda sílaba da primeira banda da palavra composta de duas palavras casadas. E o antigo “a” depois do “in” ficava para o vento. Este era um novo “a”.
Letra “a” que tinha meu nome e meu significado.
Mas não penses que tenho saudade, porque se escrevesse do que sinto falta – muito provavelmente – não chegarias nem ao terceiro parágrafo. O que sinto e, portanto, escrevo é respeito.
Respeito minha fuga da qual nunca deixei de fugir. Mas fujo de formas diferentes, cuspindo e escarrando nos obstáculos que cuspiriam e escarrariam se eu tropeçasse – Mas meu tropeço, amigo, é, bem sempre, quase nunca, externo... Assim nem que seja do escarro consigo o direito.
Escarro sim, mas preservo a mão que me afaga mesmo sabendo que é, com as licenças dos Anjos, a primeira que apedreja.
E minha arma é a palavra-proteína que constrói os músculos. Da essência os comando e escrevo a minha arma que está almada e apontada para: o dedo do pé, o sossego, o desapego, a rot(in)a.
E eu protesto, e eu grito, e eu falo do vento, da estrada de terra ou da Avenida Ventura de Farias.
Aponto minha palavra que é arma mas também própria palavra que se completa com o pronunciar-se que é o completar-se do indivíduo. E as linhas brancas gritam. E meu grito é um “beijo elétrico” que sussurra: vamos “mudar o mundo com os lábios”?
(A palavra é a arma e a música é a pronúncia agradável de gatilho).
E assim como “perder-se também é achar-se”, a fuga também é uma volta. Volto para a rotina-limite, ou com as maquiagens que estão em alta: para a (des)rotina-(i)limit(ada) de pensar e existir que vem de lucro.

quarta-feira, outubro 20, 2010

DAS CULPAS - Escute o meu silêncio


Em um mundo em que a aurora marcha para a coletividade e que todos têm direito ao grito, tornou-se comum o ato de gritar. Apenas gritar. Seja pelo pisão no pé dentro do ônibus, pelo troco que foi dado errado, ou pela situação em que se encontra o país. E com esta tão popular forma de grito, popularizou-se também o ato de colocar a culpa – não importa em que.
Se o país entra em déficit a culpa é do presidente; se a saúde não funciona a culpa é do governador; se a rua não tem pavimento a culpa é do prefeito; e se a educação não presta a culpa é do governo inteiro.
Mas claro, também existem os culpados sem culpa: o atraso foi por causa do relógio ou do transporte, a nota baixa foi o computador ou a namorada, tropeçou? Foi o horóscopo.
E no meio dessas tantas culpas surge uma que muito me assusta e que ando ouvindo de uns tempos para cá: A culpa de tudo é da cultura. Como se o ser que fala fosse uma bactéria de Marte... Como se não fossemos nós os representantes da acusada, e que a torna viva todos os dias.
É preciso, antes de tudo, distinguir o que é cultura do que é falta de ética ou educação. É preciso olhar para dentro de si mesmo e pensar no coletivo formado por outros si mesmos.
Quando Sartre falou que o inferno são os outros, é bem verdade que queimou todo mundo e elevou-se aos céus divinos, nem que seja inconscientemente. E como nem eu, nem você nem ninguém somos Sartre, será que queremos realmente ser o inferno de nós mesmos?
Confesso que já nem sei mais o que é preciso!
“Desobvializar e estralar o dedo do pé”... Talvez!

quarta-feira, outubro 13, 2010

DAS TRADIÇÕES


Faz dez meses que eu tentei escrever um manifesto sobre as tradições alagoanas que se perdem na modernidade dos tempos. Mas talvez por sono ou falta de conhecimento naquilo que escrevia, deixei o último período do texto sem pontuação alguma; nem vírgula nem ponto – muito menos ponto e vírgula.
Acontece que escrevia, com a ajuda de minha avó, sobre o pastoril: aquela competição entre azuis e vermelhos que muito tenho ouvido falar embora nunca tenha visto. Segundo ela, tratava-se de dois grupos de meninas com um menino apenas presente. Eram as azuis e as encarnadas, enquanto o menino era neutro digamos assim, e se não me falha a memória.
Enquanto disputavam quem seria o melhor grupo, cantavam rimas muito bonitas sobre a beleza e função das respectivas cores representadas por figuras que iam de borboletas a ciganas. Então encantavam o público alvo que, não raro, depositava dinheiro em um dos grupos que saía vencedor caso tivesse o maior saldo.
Então me pergunto: e hoje cadê?
Ouvi dizer que algumas senhoras se reúnem para outras senhoras e cantam e dançam como uma forma de sanar a frustração de não terem cantado e dançado enquanto jovens.
E assim como o pastoril, o guerreiro, lendário para mim em que já estive, mas só em foto, onde está?
Dizem muito que a fé é aquilo que não se vê, mas em que se acredita. Sendo assim tenho fé na cultura, na educação e na própria fé, que existem sim, mas que lutam ainda (ou então agora) para continuar. E continuam e sobrevivem porque nem costumam, nem devem faiá.

terça-feira, outubro 05, 2010

REFORMA AGRÁRIA, TURISMO, TELENOVELAS E EDUCAÇÃO


Alguém, em quem deposito um imenso respeito, falou certo dia - para espanto de muitos presentes - que há economistas que afirmam existirem três coisas para alavancar o desenvolvimento do Brasil: Reforma agrária, turismo e telenovelas.
Em parte concordo. Mas sinto que falta algo que una esses três ingredientes e acrescentar, por si só, o crescimento individual dos cidadãos. Assim, se pudesse acrescentar, diria que falta um ingrediente chamado educação. E só afirmo porque sou brasileiro que não desiste nunca, nem que seja de opinar.
Dos ,então, quatro ingredientes, penso que só a reforma agrária é o mais difícil. Você sabe o que é reforma agrária? Sabe como se faz. De onde veio, quem realmente precisa? Posso apostar que pensou em distribuição de terras... Mas até isso, que é a ideia comum que se tem da reforma, é ineficaz! Quase como distribuir aparelhos celulares sem chip em plena Amazônia – Só a terra não resolve, e disso todos sabem.
Sobre o turismo, acho que não preciso falar muito. Basta olhar para o canteiro para ver uma forma vegetal inédita em todo o planeta; anda-se um pouco e: Atlântico! Adentra-se mais um pouco e floresta, verde, viva, cachoeira. Mas de que adianta tanto verde, tanto mar, se a barriga ronca por falta de emprego?
Quanto às telenovelas, é cultura – Quer queira quer não. É costume. É também informação. Quem nunca parou para discutir a falta de ética do vilão para com os protagonistas? Quem nunca soube de uma doença velha, porém de abordagem muito recente, entre as propagandas das oito? Sobra espaço aproveitável. Mas as informações e críticas são correspondentes – sem eufemismo algum – ao nível de compreensão do público alvo.
E se elas, as novelas, muitas vezes fogem da realidade: ótimo! Quem já ouviu falar em arte?
Poderia muito bem agora mostrar gráficos; fazer comparações; dizer que a reforma agrária é antiga, salve engano desde os gregos, mas só chegou aqui no Brasil na década de 90 de forma tímida, quase inexistente.
Poderia também dizer que falta dinheiro, e que nas agências de viagens 3 dias em Paris custam menos que ver o pantanal, ou a floresta amazônica de perto.
Poderia dizer que a audiência é só o motor da máquina de dinheiro movida à merchandagem.
Mas não poderia deixar de dizer que, como a educação, a reforma antes de ser agrária deveria ser de consciência. E quem sabe sentiríamos alívio ao invés de susto ao vermos estatísticas.
Acredito no quase inacreditável: educação que é casa, trabalho e comida.
Mas como já disse outro alguém: Alimentar primeiro, educar depois. E como educação é também alimento, diria eu: Educar primeiro, educar depois.

quarta-feira, setembro 29, 2010

Mudança


Os pedaços de saudade como vidro quebrado, os riscos na parede, os adesivos na fechadura, a janela emperrada, o cheiro forte de sol quente: Coloque todos na caixa usada de eletrodoméstico.
Fotografe os cantos limpos, guarde os cantos sujos e escuros na memória. Ache antigas cartas de amizade indefinida, antigas desculpas, velhas recomendações de namoro à distância de distantes anos.
Mas não, não se esqueça das músicas... Leve-as consigo, se possível, no bolso da camisa no lado do pulmão esquerdo. Viva as antigas músicas como filme preferido que de repente passa na sessão da tarde em véspera de prova de física com todas as suas pilhas de assuntos acumulados. Lembre-se das pessoas. Leve algumas junto com as músicas; para as outras, naturalmente, existe o saco plástico azul. Mas guarde, até mesmo estas, no lugar que lhe sobrar da memória.
Conte mais uma vez os degraus dos nove andares, ritualmente como fez em outros tempos. Torça para que chova! E só então mude. Mude-se. Mudo. Quase telepático.(..)

domingo, setembro 26, 2010

Soundtrack lá lá


Duas pedras no meio do caminho conversavam:
-Paaaarece mágica!
-Eca! Mas isso não é calcinha preta?
-É.
-Você deveria ouvir Radiohead!
Não satisfeita, a pedra número dois continuou seu ritmo de salvação e bondade:
-Procure ouvir a batida que envolve lá lá bem distante (Porque nós, pedras, somos o acidente esperando para acontecer... Quem sabe um tropeço e pimba! Lá lá se foi o acidentado).
-Sinta os pulmões de ferro se enchendo daquilo que um dia precisará... E são e salvo, idioticamente, cante o hino dos hinos. Mas não se esqueça que as falsas árvores de plástico não morrem, mas também não produzem oxigênio.
-Olhe, apenas quinze passos o impedem de perceber que os quebracabeças caem em seu devido lugar, ao pé do que diz a letra até. Ou então apenas balance a cabeça e desvende o mistério: Eu sou uma aberração, um verme esquisito ou 2 + 2 =5?
E a pedra número um nunca mais foi a mesma.

quinta-feira, setembro 23, 2010

Caso de matemática às 23 horas


Disseram que zero sobre zero pode ser qualquer número, qualquer coisa. E que isso ultrapassa a matemática e cai nos ramos da filosofia. Mas então porque nos testes eu não recebo zero sobre zero no lugar da elipse vazia a quem chamados de nota ou ovo que não se sabe se veio primeiro ou depois da própria galinha?
Por que as linhas e a caneta falha me chamam toda noite nesse lugar comum que chamo de caderno? Lugar comum não seria a própria cama a essa hora? Zero sobre zero para a cama, para a caneta, para o caderno, para a pálpebra, para a matemática e para a filosofia.
Zero sobre zero que é tudo e que é nada. Que é o que não existe e o que eu já falei que existia. Zero sobre zero que eu não consigo dormir!
Zero sobre zero que eu estou preoculpado!
P.S.: Insônia é também zero sobre zero! E quando o limite da tolerância tende ao ovo-zero, tanto faz o infinito positivo ou negativo.

quarta-feira, setembro 22, 2010

Caso de Inflamação


Acordei e escorria um líquido amarelo-verde da minha unha do dedão do pé esquerdo. Lembrei-me então que faz uns dois dias havia nascido uma espinha enorme no lado direito do meu nariz, como um pircing ou zíper para o lado de dentro do corpo... E ao me olhar no espelho, a espinha estava igualmente amarela. Era a inflamação! O pus da carne e o alerta de que algo não estava bem, ao ponto de explodir a qualquer instante como uma bomba escondida ou mentira bem contada.
Depois de alimentado e devidamente arrumado, parti para a mesmice de manhã de quinta-feira, sem muitos planos, só com o fone de ouvido a guiar os passos e os pensamentos. Os pés seguiam a melodia enquanto a alma decodificava as palavras em energia para abrir de verdade os olhos ainda sonolentos ou qualquer outra coisa produtiva.
Foi quando ouvi algo que me soou muito estranho. A voz rouca do aparelho falava de paixão, de estar disponível em arrepios e esperas, em prometer mudanças, de fazer concessões. Todos aqueles versos importados da gramática inglesa me pareiam verdadeiramente inflamados... A própria palavra paixão tinha inflamado os pensamentos a alguns poucos dias.
Então confundi a música amarela com o sinal de trânsito e quase me arrancavam as pernas despertando um barulho de pneu nas linhas pontilhadas de inflamação no asfalto. Aliás, distrações e diálogos metafísicos com os eus que convergem na divergência interior é luxo. Pelo menos é assim por aqui: Ou não se pensa em nada, ou lhe arrancam as pernas!
Voltando às calçadas de pedras desiguais e matos compreensíveis a se esquivarem na direção do sol, pensei não estar o amor inflamando ao se esquivar nos números do calendário. Mas não, como poderia? O amor não inflama, seu zé! Já é, por vida, amarelo-verde - Engano de quem pensa que ele é vermelho.
Foi quando alguns operários (não encontrei outra palavra para os descrever) carregavam um grande espelho em direção a uma casa de esquina muito bem apresentável. Ali, no vidro, não tinha mar, é verdade. Mas tinha céu, tinha árvores, pássaros, fumaça, pedras e edifícios de pedras espertas. E eram todos amarelos.
Ao me refletir, ainda que de relance, o espelho não mostrou nada além de uma mancha verde-amarelo como tinta que escorre ou acne explodida.
Eu segui então assim: Amareloinflamadopensante.

terça-feira, setembro 21, 2010

O HOMEM CRU - Esquecer, e avante!


Se perguntarem porque eu escrevo, eu direi, sem muitas surpresas, que escrevo porque desejo que as ideias se libertem em palavras que dificilmente seriam ditas. Ou que as que nunca seriam ditas possam ser tão comuns quanto as conversas de elevadores - o que no fundo dá a mesma coisa!
Mas se perguntarem porque dificilmente escrevo sobre aquilo que mais me intriga, direi que é porque temo que as coisas ditas se tornem reais, ou que retornem à realidade que as pariu.
E se, por insistência, perguntarem porque acredito em tais supertições tão íntimas e infantis, direi que há crendisse para tudo. Há os que crêem na vida, os que crêem que há vida na morte e os que crêem que a vida já é a própria morte...
Há os que pensam na sorte e crêem no azar, os que pensam no azar e crêem na sorte. Há os que crêem em Deus e há os que crêem na poesia. Para estes, a própria existência é a poesia... Mas a poesia não se limita à própria existência. É o que faz o indivíduo eterno ou João Brandão.
E se me perguntarem no que creio... Perguntarei eu desta vez: Ora, mas porque não procura o que fazer?

sábado, setembro 18, 2010

Lê-se como necessário for


lentamente caminharem velhas pessoas de casal um vi Hoje
entender para novos muito olhos meus os ser pensei Eu
?rápidas muito estavam pernas minhas que será Ou
rápidos muito dias em lento caminhar a velhos de casal um Havia
...bonito tão ser parecia contrário ao mundo Seu
morte a anunciam que articulações de tropeços aos andassem que Ainda
calçada na los-ultrapassá em me-apressei, então Eu
compreenção jovem minha a para demais contrário ao Era
Ou será o meu mundo que anda na velocidade errada?

quinta-feira, setembro 02, 2010

Acordes Temporais


Quem sabe eu esqueça,
Quem sabe eu reinvente a canção do dia
Às doze horas da manha ritualmente
Quem sabe me esqueça
Quem sabe me reinvente à doze da noite, habitualmente

Quem sabe as rimas sejam falhas
E a literatura prematura,
Ou quem sabe seja o pó do nada
De tudo aquilo que sobrou do tudo
Quem sabe?

Quem sabe conte histórias aos bisnetos
De um mundo em que se sonhava
Sonhava-se que os sonhos não eram sonhos
Ou quem sabe nem tenha bisnetos
Ou quem sabe já nem tenha sonhos

Ou quem sabe que se dane
Ou que se dane quem souber.
Os despertadores sabem e vivem tão mal...
Como se comessem as cinzas das horas
E bebessem da fuligem dos parafusos, quem sabe.

Canção dos dias


Uma vez uma dessas mulheres muito velhas, muito sujas, muito simples e muito sábias que estão a uma degrau acima de nós complicados aprendizes, falou-me para pedir sempre proteção à Mãe Rainha caso viajasse de madrugada. Seus profundos olhos azuis percorreram meu corpo e minha alma e com um toque de suas mãos muito negras pude notar a seriedade de suas palavras.
Então peço todos os dias à Mãe Rainha que me ilumine nessa viagem que é viver e que o Deus supremo sempre guie o carro do meu destino. Pois só ele conhece os buracos de acaso e todos os caminhos por onde correm o meu próprio sangue. Entrego-lhe, sim, todas as minhas escolhas em busca de um átomo de serenidade de seus espinhos.
E que nas madrugadas eu possa cantar a canção do dia
E que os dias possam cantar o que conto
Enquanto conto o que ouvi cantar

terça-feira, agosto 31, 2010

Falta de ar extraída de um artigo de jornal


Em uma época de eleições como a que presenciamos, é natural que se tenha esperança de que o país possa ser considerado desenvolvido em um futuro bem próximo. Esquecem, porém, que bem antes de querer um Brasil mais equilibrado economicamente, deveríamos lutar por um país mais humano. Parece que se esqueceram do que a muito nos ensinaram: o dever de fazer o bem fechando os olhos para as classes sociais e seus poderios econômicos, paras as cores e os credos, para as inimizades ou preconceitos. Perdeu-se no tempo o respeito.
Nesse contexto de desordem em que os indivíduos se sentem superiores aos outros embora pertençam a uma mesma espécie e vivam num mesmo espaço de tempo, morreu uma vida que não havia sequer aberto os olhos ou completado a sua gestação.
Uma adolescente de quatorze anos, grávida de poucos menos de seis meses, foi informada de que o seu bebê estava em uma posição de risco e que assim, seria preciso fazer um parto cesariano de emergência. Imagino então todos os familiares rezando enquanto enxugam as lágrimas de desgosto de uma suposta gravidez precosse e não planejada. Mas o desgosto já passou, tudo o que resta é rezar para que a mãe e a criança sobrevivam.
No fundo, entretanto, todos os que rezam também se preparam: o feto ainda não foi totalmente formado e não tem todos os mecanismos de sobrevivência para enfrentar o mundo desconhecido além-ventre e pode não ter pulmões fortes ao respirar. Ou quem sabe, com um pouco mais de pessimismo, a mãe quase criança pode ter alguma hemorragia de útero resistente de quem ainda teria mais quatro meses para crescer e completar o ciclo natural da vida, e também não resistir.
Mas trata-se de uma família pobre, de uma mãe adolescente e de um hospital público. Os médicos não se mobilizam, a tarefa é arriscada demais e exigiria um maior cuidado e experiência. Talvez por falta de candidatos ao parto, ele é designado a um estudante de médico supervisionado por uma médica professora - de descaso, bem se sabe.
Assim, as mãos estudantes de último período de medicina residentes do hospital público seguram o bisturí e cortam a barriga da matriz. Bastava que essas mãos tivessem estudado melhor o caso e teriam percebido que a cria não estava em posição normal... Rasgam, dividem as carnes, mutilam e atigem o feto nas costas, acertando-lhe a coluna.
Mas trata-se de uma família pobre, de uma mãe adolescente e de um hospital público. O corpo do bebê já sem vida é escondido dentro do próprio hospital e os familiares são impedidos de verem e ficarem com o cadáver que foi morto dentro do próprio casulo de cuidado. Claro a família é desinformada, daqui a alguns dias todos ja esqueceram do ocorrido. A avó da criança contudo, para a surpresa de todos convoca a polícia e tudo é esclarecido e espalhado aos quatro ventos.
Talvez se um médico comprometido tivesse feito a tal operação de parto, a criança estaria viva, e certamente conseguiria de deesenvolver em uma encubadora, lutando para recuperar os quatro meses perdidos... Talvez, se não faltasse amor pelo outro, respeito ou comprometimento com o próximo. Talvez, se o novo médico não confundisse a frieza de sua profissão com falta de caráter, quem sabe...

domingo, agosto 22, 2010

So what?


Vontade [medo] - Mas para que diabos serve um despertador?

sexta-feira, agosto 20, 2010

Suspiro disfarçado de poema


Eu que já estive no limite do tempo
Digo que prefiro os dias normais
Em que não se pensa em quandos
E quando os ondes são os mesmos que ontem
E as barreiras sao palpáveis no impalpável pensamento
Eu que já tentei usar todos os mecanismos
De meu corpo e de minha mente
Digo que prefiro as coisas velhas que sempre são reproduzidas
E que nos conservam a lucidez do contínuo
Mesmo sabendo que bem mais vale a loucura
Que proporciona a descontínua liberdade do não sei
Não sei, mas gosto mais de mim nos dias ruins!

segunda-feira, agosto 09, 2010

Erro de português - O chute


Hoje alguém me falou que eu eescrevo errado. Mas não é nada muito gritante como um "mim" que conjuga verbo ou um "a gente vamos"... é bem pior! Hoje me fizeram perceber que escrevo letra maiúscula no meio das palavras.
E eu bem que tentei argumentar, dizer que estava certo até que decidi dizer a mim mesmo que eu estava errado, com toda a certeza. E como já dizia Cecília, uma letra muda muita coisa... Dizem até que trazia marés de azar se mal colocadas quando formamos os nomes.
E então, preoculpei-me eu. O que seria de mim se colocando uma letra maiúscula que, num conceito geral e mais popular, serve para iniciar as coisas, estaria numa tentativa de começar o que já havia começado ou de terminar quando não havia ainda terminado? Sim porque ao recomeçar, altomaticamente se termina o que vinha antes...
E assim, como ficaria meus dias sem começo meio e fim?
Existem coisas em que temos que acreditar... Mas há outras que são quebra-cabeças que me transformam em suas próprias peças, quebrando-me a cabeça. E há também as letras, que quebram ou constroem o sentido do que existe e também daquilo que não existe ainda, ou nunca haverá de existir. E é por isso - por elas, as letras - que declaro minha própria reforma ortográfica.
E o chute? Minha forma de acordar enquanto escrevo certo em linhas certas com palavras tortas.

quinta-feira, agosto 05, 2010

Ode à Maria Que Se Perdeu (Parte final)



Quem sabe ainda soa como garotinha, arrancando cabelos das bonecas mudas telepáticas de pensamentos paralíticos. Seus pensamentos - não menos paralíticos - eram agora de uma mulher de 18 anos recém completos que há exatas 12 horas havia saído pelo mundo com algumas roupas e o que sobrara da boneca, a quem proferiu sérias maldições depois de se dar conta de que as bonecas também pesam. Carregava também as lembranças, algo que ninguém poderia modificar - como modificar o que já passou?

Mas o que eram algumas gramas de boneca comparadas ao peso de sua própria existência? talvez por pesar demais esta última, a boneca foi a primeira a se perder.

Poucos sabem (é que não se falam muito sobre orfanatos por ai) mas ao completar a maior idade os órfãos ficam de órfãos de novo de proteção. Para não citar a responsabilidade, o lar, a comida, o governo, todos os abandonam e a instituição com a mesma facilidade trata de os substituir. Os bebês nascem e os órfãos brotam. E brotam como plantas em guerra por um pouco de luz ainda que seja elétrica.

Trabalhar? E no fim do dia... Deitar em que colchão se aquele não era seu. Dormir em que travesseiro se aquele também não lhe pertencia? Que teto? Sua casa não tinha teto, não tinha nada...

É bem verdade, todos tomam o caminho de ida, mas a grande maioria tem o conforto do para onde voltar. Mas trata-se de Maria, e Maria não é grande parte... Sorte ou azar, quem sabe?

Sorte. Ela não sabia o que era azar, sua vida toda fora assim. Então... Sorte! Podia ver as pedras tortas da rua - sem as gramas da boneca e da sua consciência - e sentia-se um pouco livre, um pouco presa no que também não sabia, mas que costumamos chamar de incerteza. E de incertezas passou-se o dia.

Os carros buzinavam para a mulata com cara de fome, lágrimas e nenhum amigo. Alguns gritavam altas expressões, mas não ecoavam pelos neurônios cegos de Maria, o coração não sentia nem pressentia, portanto. Mas se alguem falava palavras disfarçadas de beleza: Susto, dedos médios, Palavrões!

E assim como os faróis acendeu-se a noite e ela se fez Maria entre as três que brilhavam ao longe na escuridão dos céus. Confundida entre os faróis e as estrelhas, acabou por se encontrar no meio termo onde o vento fluido de espírito sopra para todas as direções e pode-se colorir o dia com poeiras distorcidas de palavras.

E assim Maria se perdeu.

E assim nós perdemos Maria.

when we fall in love


We just falling.

sexta-feira, maio 28, 2010

To fall in love


A estupidez mais bonita.

Créditos - Palavras de saída para um filme


O "the End" está ultrapassado, é fato. Vai ver porque é tudo ilusão o que se vê... E que finais não existem. É uma convenção pensar que um dia tudo acaba; se o concreto é aparente, o movimento vai muito mais além do visível.
É bem verdade: O movimento é invisível, não pode ser calculado ou sentido como um besliscão ou um beijo apaixonado. O filme, assim, termina quando nos esquecemos dele. É quando nada mais existe, porque o esquecimento sim é o verdadeiro determinante para a modificação. E quem nunca leu um livro sem final não sabe do que estou falando. Eu falo das entrelinhas, do pedaço de alma doado pelos autores da vida real na empatia de se ver no papel decisivo dizendo as palavras decisivas que precedem o final que não existe.
Assim somos todos protagonistas dos nossos filmes, num movimento alternado de escolhas - Escolhas... Elas são difíceis! E me pego eu pensando nelas numa quinta feira a noite. Ou isto ou aquilo, ou ela não sabe gritar, ou um lamento de um blue, ou clarice Lispector, ou a hora da estrela. A estrela sobe. A estrela desce. E eu ainda pensando em autógrafos! -
Os fins são, pois, uma constante mudança. A metamorfose ambulante são vários pontos continuando. E eu a prefiro do que ter aquela velha frase que nunca termina, misturando as ideias, ainda que me roube o fôlego. As poucas vezes que tive crises de asma me bastaram para dizer: Maior bobeira aquela frase que diz que os melhores momentos da vida são aqueles que te deixaram sem respirar.< O que é isso? Um quebra-cabeça, um bem contra o mal, um nunca me esqueça, um ponto final.

terça-feira, maio 25, 2010

Aquele Sorriso


E de repente: choque, estrondo, fulguração. E depois já não há.

Mas sobra sempre aquele sorriso belo e muito simples - não entendo o porquê de tanta complicação quando se fala sobre. É simples, sim, porque mesmo que não diga o que se quer, basta olhar nos olhos para perceber que os músculos foram calculadamente erguidos com um quê de alegria de um náufrago que contempla águas-vivas.

Elas dançam. Se parar para ouvir, sente-se a música, degusta-se o som dos pulmões aquáticos que se enchem e se esvaziam num contínuo prazer em existir. Elas dançam, e os náufragos afundam.

O ar já não há. Nem destino ou malas de roupas ou conversas prontas. Mas há águas-vivas, há música, há sorriso de pupilas que se enchem e se esvaziam num contínuo prazer em deixar de existir, ainda que aos poucos, há minutos que passam...

E de repente: Epifania. Não há música, não há nada.

Só o sorriso continunou.

domingo, maio 16, 2010

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A natureza da saudade é ambígua: associa sentimentos de solidão e tristeza – mas, iluminada pela memória, ganha contorno e expressão de felicidade. Quando Garrett a definiu como “delicioso pungir de acerbo espinho”, estava realizando a fusão desses dois aspectos opostos na fórmula feliz de um verso romântico. Em geral, vê-se na saudade o sentimento de separação e distância daquilo que se ama e não se tem. Mas todos os instantes da nossa vida não vão sendo perda, separação e distância? O nosso presente, logo que alcança o futuro, já o transforma em passado. A vida é constante perder. A vida é, pois, uma constante saudade.Há uma saudade queixosa: a que desejaria reter, fixar, possuir. Há uma saudade sábia, que deixa as coisas passarem , como se não passassem. Livrando-as do tempo, salvando a sua essência da eternidade. É a única maneira, aliás, de lhes dar permanência: imortalizá-las em amor . O verdadeiro amor é, paradoxalmente, uma saudade constante, sem egoísmo nenhum. (Cecília Meireles)
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Faz um tempo eu quis escrever algumas palavras para você viver mais.

Mas palavras não são mágicas e o tempo é muito curto... Aqui estão todas as palavras que eu não escrevi, aprisionadas numa reticencias - É que o infinito também é uma prisão. Estranho, mas a liberdade aprisiona, e é ainda mais cruel que as barreiras físicas.

Guardo para te dar as cartas que eu não escrevo e os versos que eu não te dediquei.

Guardo para te dar aquilo que não pude.

Para você, toda a minha gratidão e lágrimas.

Para você, tudo o que ainda não existe.



quarta-feira, abril 28, 2010

Maria, Maria, luz da noite e estrela do dia (Primeira parte)


Porque as linhas que se interceptam e se cruzam em espirais ate que se quebrem de tão próximas são apenas linhas... E os corações que se partem e se colam e se partem para se colarem de novo, não se partiriam se o objeto amado nao partisse. Se colam enquanto se calam ou por faltarem as palavras ou por ser o silencio a melhor solução, o que dá no mesmo no fim das contas.

Assim pensava ela, mas não sabia porque pensava. O que poderia saber de destino? Tinha uma vaga ideia de amor, pensava ser como as manhãs de domingo comendo pipoca na praça enquanto a missa demorava a comessar e a sua pele escura ardia no sol. Amor de familia, de amigo, de companheiro... não sabia que existia, só sabia que os corações eram frágeis e que as linhas do destino se separavam ou se uniam, mas quem as tecia na teia do universo não sabia... Deus não podia ser costureiro, ora!

E o coração se partia quando chegava as tardes de domingo, as pessoas vinham, viam-na, mas não paravam, não falavam, não riam dos seus sorrisos - não era feia, é bem verdade, mas era negra... Se isso era defeito não sabia, só sabia que era escura como a noite e era na noite que os maus pensamentos vinham: obra do diabo, o pai da escuridão, segundo ouviu um dia. Por isso se odiava ao se olhar no espelho, seu cabelo era crespo como esponja que dá em pé e isso era motivo de riso entre as demais meninas.

Mas nos domingos de manha, como mágica voltava a sorrir, só por ser de manha, só por comer pipoca, só por existir, só por passear! E a tarde vinha, as pessoas chegavam e algumas meninas iam... Outras ficavam por chorar, ou por saudade, ou por inveja, ou por simples desabafo de mais uma semana naquele lugar chamado Orfanato Maria de Lurdes. Seu nome? Maria. Maria de que? Maria ainda, só Maria! As pessoas riam sim, mas iam ver a menina que pintava flores do outro lado e ela ficava encostada esperando alguma alma bondosa.

Solidão, solidão... acumulavam-se os dias! As horas demoravam e ela conversava sozinha enquanto fazia as tarefas que a ela eram estipuladas. Não sabia o porque, mas era a ela que davam as tarefas mais árduas. Era a ela que faltava o travesseiro. Era a ela que chamavam maria escura. Mas o porque não sabia, a vida era um não saber... E nem disso ela sabia, achava que ja tinha vidido muito e que conhecia muitas coisas. Ja sabia, por exemplo, coser e cozinhar, sabia contar nos dedos e rezar o terço quantas vezes fosse preciso!

O que não sabia não era interessante e por isso tratava de esquecer imediatamente. Raramente, porém dava-se o luxo de se questinonar, ou melhor questinoar a boneca que foi dada no ultimo natal por alguem a quem ela nao tinha passado despercebido, mas esse alguém nunca mais havia voltado, e o coraçãosinho de criança se partira... mesmo, mesmo. Por isso descontava na boneca todas as suas angustias, as vezes arrancava os seus cabelos loiros quando ela não respondia.

Mas nunca mais a boneca Clara havia dito uma unica palavra, também ja estava quase careca e os seios de maria escura ja comessavam a aparecer no vestido. Disseram uma vez que menina moça não conseguia família, por isso andava curvada tentando ao máximo esconder seus doze anos, e toda vez que pensava nisso desejava não ter crescido, ou quem sabe não ter nascido... O que salvava suas alegrias era o sabado a noite, quando dormia feliz por ser o ultimo dia antes das horas ensolaradas antes da missa.

E assim, filha de zé ninguém com dona fulana, não tinha beijo de boa noite, nem nunca ouviu um "eu te amo". Sentia um vazio, mas não sabia de que... E vazios são sempre roxos e frios quando não são preenchidos por nada, nem que seja por ódio, mas isso ela também nao conhecia.

terça-feira, março 23, 2010

Outono que sempre chega (Um dia serei eu a folha)


1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10... Lá vou eu...

Esconderam-se os sonhos, os dias, as esperanças... Escondeu-se a vida.

Ainda cabe aqui um trecho da Canção de outono: Tu és a folha de outono/ voante pelo jardim/ Deixo-te a minha saudade/- A melhor parte de mim.

E quando voares pelos jardins nunca te esqueças que carregas um pouco de mim e de tudo.

Dentro dos teus sorrisos aprendi também a sorrir. Mas, folha seca que padece, meus risos de agora são molhados por lágrimas de lembranças, e elas ardem por tudo que ficou por falar e por aquilo que ficou por fazer...

Desculpa folha seca, mas é verde que eu vou te guardar. É verde que ficarás dentro do peito, viva, pulsante, simples, inocente, Jéssica.

...


sexta-feira, março 12, 2010

All I don´t care 'bout is talking, Talking only me and me.


É que eu ja havia falado de átomos e de sentimentos. Sentimentos atômicos, então... Ja habitei teatros e todos os espaços que existem em seus interiores. Já viajei com o vento e deixei que as palavras se autofecundassem originando sopros de significação. Decodifiquei sextas-feiras e outros dias comuns... Mas isto é pouco!

Quero desvendar o que existe no outro. Os teatros, os bares, os palácios, as cavernas na montanha. Onde se misturam os sorrisos e as lágrimas? - Eu quero ser o assovio da cantada e a ruga da aproximação das sobrancelhas, ser o enredo, o desenvolvimento. Eu quero ser a página.

Se isso tem nome?........................................Inveja cinza.



quarta-feira, janeiro 27, 2010

Ivisível


Como amor escondido ou notas de violão, minha fé é invisível... Estou crente no amanhã. .