terça-feira, abril 12, 2011

SORRIR É UM ATO COMPLICADO


De uns tempos para cá ser feliz é tão obrigatório... Faz uns anos que o sorriso não é mais só expressão, é também mercadoria, produto – da pasta de dente, do condomíneo de casas, do carro zero kilômetros, do refrigerante vermelho e preto. As pessoas, assim como eu, são empurradas ao ato de sorrir, não importa o quão tristes ou apáticas estejam.

Mas o problema não é sorrir quando não se tem vontade, é sorrir quando se quer sorrir. Com quantos olhos se diferencia os que sorriem mesmo de felicidade? E os que usam óculos, coitados? Janelas da alma com vidro de proteção.

Se pudesse deixar algum aviso à sociedade sorriso de que sorrindo faço parte, diria: profundidade é lei – não importa se tu és riso alegre ou lágrima. Será que a verdade também vende um milhão de cópias?

domingo, abril 10, 2011

QUATRO OLHOS - parte III



Um, dois, três, quatro, cinco, escondiam-se todos e os dois sempre juntos. Um amor de bananeiras, mangueiras e dois meses de risos e promessas tão curtas quanto a vida parecia ser – e era. Final de férias, o calendário voltou para Pequenograndópoles.

E ele era vulnerável, perdia folhas, chegavam outras. Então, reencontrou alguém que não via a seis meses e também se juntaram em beijos de quatro olhos. Mas quando ele voltava às proximidas da terra de leite e mel e via Simplicidade em sua beleza quase infantil de frases gramaticalmente livres, percebia que já nao eram mais um – e que deixaram de ser sem nenhum aviso prévio.

Eles conversavam sobre quase tudo, e depois de dois CDs que o calendário fez questão de entregar à moça, seus tios assumiram que eram dois, heterogeniamente quebrados. Para vê-la então, teria que pedalar até as núvens altas ou mandar um recado via alguém que passeava em carroças de burro. Mas calendário era preguiça, ou amor a outras pétalas agora.

Foi-se um ano, e em Pequenograndópoles, a Rosa Urbana – de sobrenome, sim senhor – com quem juntava os olhos, estava fora de si desde uns tempos (ou quem sabe era ele, tanto faz!). Encurralou-o. Foi-se um ano. A rosa saiu ferida. O calendário sem algumas páginas. E quando parou o tempo, o Calendário quase parou, não fosse Simplicidade para lembrar-lhe que os dias independem das horas e que ele deveria viver mais de palavras e não apenas dos números. Não raro, o relógio se perdia, sem querer, ou as horas eram trocadas como em mágica nos pulsos do garoto. Ele nao gostava dos números... Ficava mesmo feliz quando liam a parte de trás de todas as suas folhas. O seu lado B. Simpatias, dias de santo e de trabalhador para alguns, um pouco míopes: segredo.

E agora então... Longe de mim querer encurtar a história, exaltar ou diminuir partes. Afinal, trata-se de pessoas! E as pessoas são bastante complicadas. Talvez, por isso, não tenho melhor maneira de mostrar-lhes o que aconteceu, senão com elas, as reticências.

...

Entenda-as porém como um ponto de interrogação, uma icógnita,ou um imenso espaço em branco. Ou melhor, apenas um imenso espaço. Não sei como recomeço, pois. Se fosse eu Clarice , e tivesse todas as folhes de liz do peito voltadas para a inteligência criativa que beira a exentricidade, poderia também começar com uma vírgula. Uma pequena pausa depois de tudo o que foi dito naqueles três pontos alinhados no papel. Mas não a sou.

E como também não sou Cecília poderia utilizar-me das aspas: “O amor é uma saudade constante, sem egoísmo nenhum”. E o calendário já não sabia o que amava, se era ao próprio amor, à saudade constante de trilhares de coisas juntas, ou ao egoísmo que não tinha. Amava sim, mas a sua própria existência. Passara dias sem ar com injeções de datas em suas folhas em branco. Mas era um calendário metalinguístico. Dava ao papel em branco de que era feito, a branquidão que se passava em seu conjunto inteiro.