
Com o lápis roubado de alguém e o pensamento roubado de outros tempos (passado e futuro numa mesma gaveta), eu escrevo. Reporto-me aos tempos que, cansado de ser eu mesmo, desprendi-me procurando o horizonte de outros eus.
Era uma questão de amor: queria amar o entendimento, entender todos (pensantes ou coisas) porque todos eram o que eu era. E eu era a fumaça, a distância, o acostamento, o símbolo do infinito, o número i.
E nessa questão de amar o desprendimento sobraram só as palavras que eram infinitos de sentido muito similar que pulavam de minha mente quando vibravam as cordas vocais, sem pudor nem restrições que é coisa de um ser só quando sabe que é só. Sol só. Só mar.
E de mares e de sois rugia o que chamam desejo. E também só desejava andar com as pernas ou com as rodas de bicicleta. Queria o vento, queria o sol que nasce, queria água potável que era o próton de tudo, queria a fuga do que não se sabe ao certo: talvez rotina ou limite.
E a rotina e o limite poderiam casar-se enquanto substantivos e exercer diversas trocas de posições como fazem alguns casais modernos que ora são adjetivo ora são substantivo que são. Segunda: rotina-limite. Terça: limite-rotina. Quarta: rotina-limite-rotina -----------------------------------------------------------------
Até que chegou o dia da rota-limite, que se tornou rota-limitada, mesmo sentindo a falta do “in” que carregava do meio da segunda sílaba da primeira banda da palavra composta de duas palavras casadas. E o antigo “a” depois do “in” ficava para o vento. Este era um novo “a”.
Letra “a” que tinha meu nome e meu significado.
Mas não penses que tenho saudade, porque se escrevesse do que sinto falta – muito provavelmente – não chegarias nem ao terceiro parágrafo. O que sinto e, portanto, escrevo é respeito.
Respeito minha fuga da qual nunca deixei de fugir. Mas fujo de formas diferentes, cuspindo e escarrando nos obstáculos que cuspiriam e escarrariam se eu tropeçasse – Mas meu tropeço, amigo, é, bem sempre, quase nunca, externo... Assim nem que seja do escarro consigo o direito.
Escarro sim, mas preservo a mão que me afaga mesmo sabendo que é, com as licenças dos Anjos, a primeira que apedreja.
E minha arma é a palavra-proteína que constrói os músculos. Da essência os comando e escrevo a minha arma que está almada e apontada para: o dedo do pé, o sossego, o desapego, a rot(in)a.
E eu protesto, e eu grito, e eu falo do vento, da estrada de terra ou da Avenida Ventura de Farias.
Aponto minha palavra que é arma mas também própria palavra que se completa com o pronunciar-se que é o completar-se do indivíduo. E as linhas brancas gritam. E meu grito é um “beijo elétrico” que sussurra: vamos “mudar o mundo com os lábios”?
(A palavra é a arma e a música é a pronúncia agradável de gatilho).
E assim como “perder-se também é achar-se”, a fuga também é uma volta. Volto para a rotina-limite, ou com as maquiagens que estão em alta: para a (des)rotina-(i)limit(ada) de pensar e existir que vem de lucro.