domingo, abril 10, 2011

QUATRO OLHOS - parte III



Um, dois, três, quatro, cinco, escondiam-se todos e os dois sempre juntos. Um amor de bananeiras, mangueiras e dois meses de risos e promessas tão curtas quanto a vida parecia ser – e era. Final de férias, o calendário voltou para Pequenograndópoles.

E ele era vulnerável, perdia folhas, chegavam outras. Então, reencontrou alguém que não via a seis meses e também se juntaram em beijos de quatro olhos. Mas quando ele voltava às proximidas da terra de leite e mel e via Simplicidade em sua beleza quase infantil de frases gramaticalmente livres, percebia que já nao eram mais um – e que deixaram de ser sem nenhum aviso prévio.

Eles conversavam sobre quase tudo, e depois de dois CDs que o calendário fez questão de entregar à moça, seus tios assumiram que eram dois, heterogeniamente quebrados. Para vê-la então, teria que pedalar até as núvens altas ou mandar um recado via alguém que passeava em carroças de burro. Mas calendário era preguiça, ou amor a outras pétalas agora.

Foi-se um ano, e em Pequenograndópoles, a Rosa Urbana – de sobrenome, sim senhor – com quem juntava os olhos, estava fora de si desde uns tempos (ou quem sabe era ele, tanto faz!). Encurralou-o. Foi-se um ano. A rosa saiu ferida. O calendário sem algumas páginas. E quando parou o tempo, o Calendário quase parou, não fosse Simplicidade para lembrar-lhe que os dias independem das horas e que ele deveria viver mais de palavras e não apenas dos números. Não raro, o relógio se perdia, sem querer, ou as horas eram trocadas como em mágica nos pulsos do garoto. Ele nao gostava dos números... Ficava mesmo feliz quando liam a parte de trás de todas as suas folhas. O seu lado B. Simpatias, dias de santo e de trabalhador para alguns, um pouco míopes: segredo.

E agora então... Longe de mim querer encurtar a história, exaltar ou diminuir partes. Afinal, trata-se de pessoas! E as pessoas são bastante complicadas. Talvez, por isso, não tenho melhor maneira de mostrar-lhes o que aconteceu, senão com elas, as reticências.

...

Entenda-as porém como um ponto de interrogação, uma icógnita,ou um imenso espaço em branco. Ou melhor, apenas um imenso espaço. Não sei como recomeço, pois. Se fosse eu Clarice , e tivesse todas as folhes de liz do peito voltadas para a inteligência criativa que beira a exentricidade, poderia também começar com uma vírgula. Uma pequena pausa depois de tudo o que foi dito naqueles três pontos alinhados no papel. Mas não a sou.

E como também não sou Cecília poderia utilizar-me das aspas: “O amor é uma saudade constante, sem egoísmo nenhum”. E o calendário já não sabia o que amava, se era ao próprio amor, à saudade constante de trilhares de coisas juntas, ou ao egoísmo que não tinha. Amava sim, mas a sua própria existência. Passara dias sem ar com injeções de datas em suas folhas em branco. Mas era um calendário metalinguístico. Dava ao papel em branco de que era feito, a branquidão que se passava em seu conjunto inteiro.

Um comentário:

Anônimo disse...

Lembro-me aos poucos do menino ingênuo e aparentemente mimado sobre quem conversávamos ontem à noite. Era uma das poucas pessoas que me escutavam as verborreias figurativas de todos os dias. Era um menino 4 anos mais novo, e às vezes mais maduro que eu. Aprendia com o tempo o que era metáfora e tentava inocentemente utilizá-las quando possível. À medida que caminhava com os próprios pés, ele tentava abstrações com as próprias palavras.

Agora hoje vejo que esse menino, ainda mais novo que eu 4 anos (coisa que eu nunca entendi, pois já se passou tanto tempo!) escreveu uma das Alegorias mais fantásticas que eu já li em toda a minha vida. Goethe, Clarice, Cecília, se vivos, morreriam de inveja!

Cada palavra me fazia desfrutar de uma nova sensação a ponto de eu sentir a brisa do campo, o cheiro das mangueiras. Disse e repito, vc hoje é o cara mais indicado a ser lido e exemplificado como uma aula de Figuras de Linguagem.

Sou absolutamente seu fã, meu velho! Já chegou um tempo em que há um desnivelamento poético entre nós! Não tenho como competir, caso resolvêssemos fazê-lo.

Minha admiração por você extrapola a formação de conceitos, não há nem como eu materializá-la em palavras, portanto eu paro por aqui.

Abração, meu velho!